Bem-vindos à CASA DE AMIGOS!

Dou as boa-vindas a todos e faço votos de boas leituras!

A princípio esse era um blog para que eu divulgasse meus poemas e textos. Hoje não sei mais... Talvez, junto comigo, ele tenha se transformado e essa "Casa de Amigos" venha a se tornar não só lar dos meus delírios como também de meus desabafos...

Acompanhem também os textos no Arquivo do Blog (disponível no lado esquerdo da página)...

Comentários são sempre bem-vindos!

Páginas

terça-feira, 14 de julho de 2009

O caminho é arriscado

Era como se as gotas de água fossem maiores do que de costume. Os dois corriam desvairados em um mundo onde tudo era maior do que se imagina. Perdidos... Mas convictos, como se buscassem desesperadamente algo. E não seriam as gotas gigantes, os enormes prédios, aqueles altos seres, nem o estresse urbano que os deteriam.

Mas o desespero foi passando. Pararam, enfim, embaixo de uma marquise que parecia alcançar o céu de tão alta. Mas logo se preocuparam. Pessoas, muitas se amotinaram correndo, desesperadamente apressadas, de um lado ao outro da calçada. E, para não ser atropelados, ambos tornaram a correr. Até que acharam um lugar escondidinho entre as enormes sacas de uma loja de legumes ali perto.

-Uruan! Não deveríamos ter vindo. Se tivéssemos escutado o Conselho...

-Talvez, nossa última chance estaria perdida. Sei que tem uma passagem aqui na cidade.

-Mas você sabe exatamente onde? Já viu?! A cidade é enorme, principalmente para nós. Seriam anos procurando...

-Eu sei Solar. Mas a gente acha! Lembra do que o mestre disse? Somente quando a lua brilha desimpedida...

-Conseguimos ver a porta se abrir. Sim eu sei, mas mesmo assim num é nada muito grande para localizarmos com facilidade.

-Os seres da floresta reconhecem o faro de magia quando ela se mostra... não se esqueça! Só temos que esperar anoitecer.

-Você perdeu o juízo, Uruan? Olha o céu! Por mais que hoje seja noite de lua cheia, mas olha a chuva... Não haverá lua visível. Perdemos a viagem.

-Solar... Para que servem seus poderes se não para libertar o sol? É só...

-Sei o que você quer que eu faça, mas não! Lembre-se das regras! Nenhuma fada pode usar seus poderes antes de receber suas asas. O que significa daqui há duas primaveras.

-Ninguém vai saber...

-A, vai sim! Somos vigiadas de perto pela fada mentora... Vocês duendes estão acostumado com a liberdade em excesso. Nós fadas seguimos um rigor, uma hierarquia!

-Tudo bem então! Que tal perguntarmos aos seres humanos se eles sabem onde se abre a pequena passagem para a terra perdida?

-Haha! Até parece. Você sabe que eles não podem nos ver ou ouvir.

-Eu sei! Estava caçoando de você, com seu jeito politicamente correto.

-É melhor voltarmos! Nos desculpamos com o Conselho e aceitamos a punição! Ai! Santa natureza! Vão adiar a entrega de minhas asas... E meu casamento com Lunus, então... Com certeza vai ser cancelado.

-Você se preocupa demais. Modéstia parte, não sei o que vocês vêem nos machos de sua espécie. São horríveis!

-Ah! Olha quem fala! Se acha o mais lindo dos seres, não?! Para sua informação as fadas não vêem a beleza física.

-Então, por que as fêmeas são tão lindas?

-A natureza nos fez assim, não cabe a nós questionar sua sabedoria!

-Tudo bem! Mas o que fazemos?

E permaneceram os dois lá a tarde toda, discutindo sobre se voltavam ou não para a casa. Iam comendo das folhas que caíam no chão, vindas daquela saca alta e gorda. Mas o tempo passava e passava. E não chegaram a conclusão nenhuma.

Foi nesse meio tempo que fecharam a loja e guardaram a saca, deixando os dois mais uma vez desprotegidos. Mas, de repente, uma bela mulher se aproximou, abaixou, olhou-os com esmero. Os dois não percebiam aquela mulher, pois estavam cegos tentando ver quem tinha a razão.

-Até parece que um duende idiota como você sabe usar magia do tempo! Esse é um dom dado as fadas como eu! Você é um guardião, um ser que atende a pedidos para que não violem nosso mundo!

-Acontece que sem nós, duendes, também não existiram as fadas mais. Ou você esquece que já evitamos muitos intrusos...

-Não, não esqueço. Mas não é por isso que tenho que fazer suas vontades.

-Nem eu a sua!

-Ótimo então! Vamos...

-Com licença madame. A senhorita perdeu algo? Está aí abaixada desde que fechei a loja, e preciso varre a calçada antes de ir. Posso ajudar em algo?

-Obrigado, querido. Mas receio ter perdido um brinco muito pequeno. Mas eu acho sozinha. O senhor pode varrer aquele outro lado primeiro? Assim tento achá-los. Se o senhor chegar aqui e ainda estiver, deixarei isso para lá.

-Claro. Com licença!

-Hei vocês dois!

Nem o duende nem a fada pareceram se importar e continuaram a discutir. Mas a mulher estava decidida a fazer contato, pegou os dois com as mãos, ergueu-se. Os pequeninos em sua mão pareciam assustados, enquanto ela se erguia a discussão era outra:

-Como vamos descer? Não tenho asas e ela não nos pode ver...

-Já estamos muito alto. Teremos que pular quando virmos alguma coisa por perto e...

-Não terão que fazer nada. Posso vê-los sim! E peguei vocês porque o dono da quitanda estava a varrer a rua, e jogaria vocês no lixo!

-Solar! Você não disse que nenhum humano poderia nos ver?!

-É o que está escrito no regulamento do livro de magia!

-E o que é lixo!

-Isso não importa pequeninos. Logo mais explico tudo. Mas me digam o que vocês fazem tão longe da floresta em um dia chuvoso? Nem Lua Azul é!

-Como sabe da Lua Azul?!

-Ah! Estamos procurando o portal para a terra perdida.

-Uruan!!! Não revele nossos planos a estranhos, ainda mais humanos que têm o coração tão duvidoso!

-Desculpe! Mas pensei que já que ela pode nos ouvir, talvez possa também nos ajudar.

A mulher que deliciava com a discussão entre os dois em sua mão apenas disse:

-E posso!

O choque ao ouvir essas palavras foi algo estrondosamente grande a ponto de deixar o duende e a fada paralisados. Uma mulher, humana, podia vê-los, ouvi-los e sabia sobre o portal. Era impossível, ia contra todas as regras do livro de magia.

-Quando chegarmos em minha casa eu converso com vocês. Agora entrem aqui!

-E aquela mulher abriu uma bolsinha cheia de moedas, colocou os dois pequeninos perplexados lá dentro e a fechou dizendo:

-Não quero parecer louca levando vocês dois na mão. Obrigado senhor! Já achei o que buscava! Boa noite!

-Boa noite, senhorita! Passar bem!

Caminhou mais um pouco e uma linda sombrinha florida foi aberta pelas mãos daquela mulher, que saiu toda alegre e contente pela calçada.

Passaram-se alguns minutos e lá estava aquela mesma mulher sentada em um banco de um ônibus, sorridente, apesar do ar abafado provocado pelas janelas fechadas e do incomodo ocasionado pelo ônibus em andamento.

Desceram em um ponto uns dez minutos do ponto de partida. A Mulher agradeceu o motorista, e caminhou pela rua chuvosa, mais uma vez com sua linda sombrinha florida.

Após algumas ruas aqui, esquinas ali, entraram em uma propriedade diferente de todas do quarteirão. A rua era sem beleza, toda em concreto, sem vida. Mas a casa não. Um jardim vasto e lindo, com uma casinha pequena e simples ao centro. Parecia um chalé retirado dos contos de fada.

A mulher entrou apressada, sentou-se na mesa da cozinha, retirou a bolsa e soltou os dois em sua mesa.

-Seqüestro! Solar, acho que ta na hora, use sua magia!

-Não vou contrariar as regras até ter certeza. Já estamos enrascados demais com essa história para poder acumular mais desavenças com o Conselho!

-Não estou seqüestrando vocês. Disse que posso ajudar e vou. Esperem aí que vou apenas colocar a chaleira no fogo.

E lá foi a mulher. Acendeu seu fogão e pôs uma linda e reluzente chaleira com água para ferver.

Enquanto isso, os pequeninos admiravam o ambiente. Uma cozinha sem requinte, mas limpa até o último centímetro. Lindos copos a amostra, xícaras, taças, louças, lindas panelas, tudo guardado em um armário antigo e rústico próximo da mesa. Perto do fogão, viram uma pia feita em mármore e toda delicada e detalhada com plantas e ervas. E poderam admirar, por fim, a linda parede em tom amarelado com lindos desenhos de natureza, de fadas, doendes e outros seres mágicos.

-Veja, ela não pode ser má! Ou não teria toda essa obra de arte!

-É linda sim, mas as aparências enganam. Tudo pode ser um troque.

-Meus pequenos, gostaram da decoração?! Eu mesma que fiz. Até os desenhos. Bem vamos conversar então!

-Quem é a senhora! O que quer conosco!

-Calma, rapazinho. Você deve ser Uruan, e você Solar. Meu nome é Marta. Sou uma bruxa. Não são muitas na minha condição que tem o privilégio de enxergar vocês. Muitas de nós só os sentem. Mas eu nasci com esse dom.

-Bruxa é?! Disseram que vocês estavam extintas.

-E estamos. Minha cara, ainda existem poucas de nós. Alguns bruxos e bruxas têm uma vida como eu, anônima. Vivemos como qualquer humano, nos misturamos a eles. Assim garantimos nossa sobrevivência desde o Caça às Bruxas. Hoje poucos de nós saem do Armário de Vassouras.

-Pode até ser. Mas então nos prove!

-Menininho atrevido você. Mas tudo bem. Não possuímos poderes como os de vocês, apenas lidamos com as energias que emanam da Mãe.

-Não acredito que seja bruxa então! Meu rei sempre me disse que as bruxas tinham poderes fantásticos de moldar a situação, que dominavam as leis da magia e sabiam como usar a arte com total perfeição.

-E sabemos... Sabe, nossos poderes não são imediatos como os seus, usamos da energia da natureza para fazer o que é certo e não para jogar.

-As bruxas, Uruan, são as guardiãs do equilíbrio universal, assim como nós guardamos o equilíbrio dentro dessa natureza aqui.

-Exatamente.

-Você disse que poderia nos ajudar... Como?! – disse Uruan ainda com tom de incredulidade.

-A terra perdida é um mundo onde só os seres pequenos dessa natureza podem entrar. Mas o portal, visível ou não, não se fecha, está sempre lá!

-Mas só podemos localizar ele quando fica visível.

-Sim eu sei. Mas conheço um bem perto daqui. Mas antes de indicar o caminho para vocês, terão de me contar o que querem lá! Pelo que percebi, você é uma fada sem asas e você um duende sem chapéu. O que significa, se bem sei, que nenhum dos dois estão aptos a realizarem missões!

-Viu! Eu disse que ela seria problema! – Uruan falou com aquele olhar “sou esperto”.

-Não, não vou! Apenas, se o motivo não for justo, vou devolvê-los a passagem mais próxima para o mundo de vocês.

-Ah, Marta, nós buscamos uma relíquia antiga... Uma espécie de poder para dar as boas vindas ao novo reinado que está para começar.

-Sei... E vocês fazem isso com a permissão de seus superiores?

-Não, não fazemos! Satisfeita?!

-Não! Mocinho, trate-se de se comportar, ou vou trancá-lo para poder conversar com Solar.

-Me tranca que te envelheço. Tenho meus truques.

-Que só funcionam até o próximo amanhecer. Agora aquiete-se!

-Mas diga, minha querida. O que vocês querem, de verdade? Sei que esse não é o motivo principal.

-Na verdade, eu vou me casar com o futuro Rei das Fadas, mas não tenho honra suficiente para isso. Então, Uruan me convenceu a buscar a relíquia da visão na terra perdida. O que facilitaria o Conselho a fazer o que é certo para equilibrar esse mundo que vocês, humanos, têm destruído com tanta velocidade, e me traria honra. De início achei legal, mas chegando aqui, percebi que era um erro. Mas Uruan não se convence.

-Agora a culpa é minha se você não tem honra!

-Não, não é! Mas é maluquice prosseguir!

-O mundo está em caos. A guerra dominou tudo. Essa relíquia poderá nos ajudar a ver como agir. E não pretendo sair da terra perdida depois que entrar lá! Dizem que é um mundo fantástico, onde tudo é possível e onde não somos inferiores pelo que somos, mas pelo que não somos.

-Entendo ambos. Mas acho que, Nem você Uruan está certo, e nem você Solar. Devem sim buscar a relíquia e dá-la ao Conselho. Mas devem ambos retornar. Ninguém inicia uma missão sem estar pronta para ela. A Mãe é sábia. Quanto sua honra... Quer mais do que se casar com o futuro rei? Se ele te escolheu é porque sua alma tem honra suficiente para isso. Vamos anime-se... Vou levá-los até o portal.

-Eu vou ficar lá!

-Se você ficar, Uruan. Vai passar uma vida deslocado. Não há seres como você lá! Os seres do mundo perdido são seres grandes, que seriam facilmente visíveis e caçados aqui.

-Como o que?

-Dragões, unicórnios, fênix, centauros...

-Pela natureza! Como vamos passar por eles.

-Não se preocupem. Não lhes farão mal algum, a menos que os desafiem. Bem. Chegando lá, procurem o líder dos centauros, se vocês o fizerem agrados, ele os levará até a relíquia e indicará um portal que abre e fecha até o mundo de vocês. Se não, serão convidados a sair da terra perdida.

-E onde é o portal que falou?

-A sim venham!

E novamente a mulher pegou-os com a mão, saiu de seu chalé e caminho com sua linda sombrinha aberta até o fundo de seu quintal, onde tinha uma linda árvore reluzindo os barulhos do céu nublado que dava a singela impressão de estar se deliciando com a chuva.

-Estão vendo aquela árvore? Vou deixá-los lá! Nos pés dela digam três vezes. Somos pequenos e queremos entrar! E passarão para a terra perdida.

-Tudo bem!

-Depois não poderei fazer mais nada! Se conseguirem sucesso nisso, meu amiguinho duende, você pode me enviar uma saca de frutas selvagens... mesmo desaparecendo no amanhecer, saberei que conseguiram.

-Ah, faço isso sim! Mas ainda quero ficar lá!

-Saberei se desistiu ou não dessa idéia.
E a bruxa colocou os dois aos pés da árvore, deu um aceno com a mão e voltou para seu chalé.
Passaram-se dias e dias, e a saca não chegou. Foi quando a bruxa já tinha desistido dos dois pequeninos que eles apareceram dentro de sua cozinha.

A fada estava com lindas asas cor do sol e o duende com um chapéu-coco verde musgo. Ambos carregavam uma pesada coroa de flores.

Quando a bruxa chegou em casa ela quase chorou com a cena.

-Marta! Um presente para você!

-E não é magia de duende...

-É de fada mesmo!

-Céus! Obrigado! Danadinhos. Fiquei esperando a saca!

-Decidimos que você merecia mais... Nos deu uma arma a mais para lutar contra o caos e nos ajudou a sobreviver.Obrigado!

-E você não ficou lá, não é, mocinho?

-Pois é! Detesto admitir, mas você estava certa! Prefiro a floresta... apesar...

-Apesar que nada! Viva a vida!

-Essa coroa é sua. Um presente nosso e de todos os seres da floresta.

Quando a fada terminou de falar, a bruxa se viu rodeada por fadas, duendes, gnomos e outros seres magníficos. Todos alegres e a saudando. Foi então que as fadas pegaram a coroa e, voando, a despejaram sobre a cabeça da bruxa.

Naquela noite, não existiu conselho, mas sonhos que perduraram...


D’Artagnan Abdias Silva.

Nenhum comentário: