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terça-feira, 14 de julho de 2009

O conto da Bruxa Maldita

Em tempos antigos, em um pequeno povoado, terra de grandes feiticeiros, existia uma bruxa, já velha, feia e coberta de verrugas. A velha bruxa portava sempre seu simples vestido remendado em tecidos escuros, seu xale de fios pretos e finos que mais pareciam uma teia de aranha velha, seus sapatos já gastos sob pés descalços do manto costumeiro; seu cabelo rebelde e mau cuidado negava-se a parar no coque mau feito e sem esmero.

No pequeno vilarejo de Kasynkeirt habitante nenhum ousava se aproximar da velha bruxa, a qual sobrevivia das caridades recebidas de seus parentes de muito longe que há muito não os via, mas que lhe enviavam mantimentos, hora por pena, hora por pedidos teimosos da bruxa que há mais de trinta anos não saia de seu pobre e morto jardim.

Às vezes, podia se ver a vela queimar próximo a janela e, para os que se aproximavam, era possível vê-la sentada a cochilar em sua cadeira dura, seca e já quebrada próxima a lareira. Sobre a mesa do casebre via-se pouca fartura e pouca sujeira, como em toda casa, mas garanto, a limpeza era sem brilho e esmero e as aranhas de muito gostavam de lá. Dentro da lareira postava-se um caldeirão grande e enferrujado, há muito inutilizado. O quarto, quase ausente, era menor que os poucos móveis – a cama velha, quebrada e desarrumada; o guarda-roupas pequeno e já sem portas; e a escrivaninha desnorteada e pequena sobre a qual jazia um livro negro e empoeirado, um castiçal remendado, uma pena e tinteiro já esgotados. Os jardins, sem vida e de terra batida, parecia retratar o interior da casa e o desleixo de sua dona, cercado com madeira de tronco velho que só o chão marcava, pois já perdera o sustento.

A velha rotina também não mudara, o levantar junto ao sol, jejuar até que a cidade levantasse sua voz, comer da pouca comida, sentar em sua escrivaninha e reler os ensinamentos de seus ancestrais a procura de algo revolucionário. Servir-se dos poucos grãos de feijão socados quando o sol chegasse ao pico, sentar-se no velho banco de trançagem em palha gasta e olhar ao longe o movimento do vilarejo sempre entusiasmado. Quando o sol se inclinava, a velha bruxa entrava, acendia sua lareira, sentava-se junto a ela e meditava sobe a vida. Com o céu obscuro o destino era apenas o refúgio no mundo dos sonhos que nem mais belo lhe era.

Certo dia, ao sair para seu jardim ela encontra os novos dados de seu primo distante: a mesma saca de feijão e trigo para o pão, garrafas de vinho, pois de água a mina já saciava e negar a bebida santa era crime em outra região. Junto havia uma carta que ela apressadamente pôs-se a ler.


“Senhora Trirya, quem lhe escreve é o servo de teu primo, para quem ele deixou a vasta fazenda do lado de cá. Creio que sabes que ele nega vosso parentesco, pois a fama em que a senhora possuí não é das boas: ‘a bruxa maldita’. Sou eu quem faz as entregas ao mando de teu primo.

Venho comunicar-te que o senhor Jorocc faleceu noite passada após separar estas sacas e vinhos. Sei que tua situação é trágica e prometo continuar com as remeças, mas peço meu anonimato para proteger as trocas do feudo de cá e continuar o sustento dos demais servos que agora são meus.”.


Ao ler, a velha bruxa sentiu-se abandonada e finalmente só, perdera o único parente vivo, mas sentiu-se consolada com a caridade do servo, afinal, um dia aconteceria. Recolheu as sacas e voltou a sua rotina.

A noite em que se seguia era a primeira lua redonda, e sendo assim, a bruxa se preparou para o ritual costumeiro de conversar com a Deusa.

Quando a lua, enfim, tornou-se plena ela invocou a Deusa e ambas puderam conversar:

-Deusa, querida, muito tenho te honrado e tu nada me deste!

-Filha, lhe dei a vida, não há presente maior, mas ainda dei-lhe o poder, e pode construir seu próprio destino.

-Tenho vida e poder, mas sou amaldiçoada em meu ser, o que posso fazer?

-Tu me amas? Verdadeiramente?

-Sim, amo-te!

-Então quando meu ciclo for meiado e eu ocultar-me vá a vila. E conte-me tudo na próxima lua cheia!

Sem muito entender foi o que a bruxa fez. No primeiro dia após a lua nova ela saiu e foi a vila. Os habitantes espantados em vê-la se afastavam, mas em sua ilusão a bruxa apenas via a alegria das cores e do novo mundo.

Na próxima lua cheia a Deusa foi a sua procura:

-E então, minha filha, como foi?

-Ótimo, minha mãe! Penso em voltar lá novamente amanhã.

Não, se quiseres visitar a vila vais à mesma época da passada e traga-me a mais bela flor que encontrar.

E a bruxa o fez, mas desta vez, ao colher a flor, os cidadãos começaram a gritar:

-Maldita!

-Bruxa maldita! Volte para as trevas de seu lar improdutivo!

-É! Não serves ao nosso meio!

Abatida a bruxa voltou chorando, mas dentro de sua casa um anjo a aguardava, e ao entrar ele a abraçou e disse:

-Estou com você e juntos vamos vencer!

-Mas o que posso fazer? Sol maldita como o ventre sem filhos mesmo.

-Podes tudo, se o crer! Vamos! Vê a terra lá fora? Plante nela grãos de milho, os que achaste no chão, grãos de trigo e de feijão. Na porta de seu jardim enterre a rosa, e a Deusa a receberá. E derrame todo o seu vinho sobre o solo, mas cuida dele e seu jardim será o mais belo.

A bruxa o fez enquanto o anjo fazia o velho casebre brilhar com o esmero de seu toque.

O tempo foi passando e, após um ano, o jardim da bruxa era o mais belo já visto, e todos do vilarejo o cobiçavam. O anjo reapareceu e disse:

-Agora reparta seus frutos com a vila, e quando sentir que é a hora clame pela Mãe.

A bruxa repartiu cada grão com a vila que por interesse tudo aceitava; até que em uma manhã, a velha bruxa não conseguiu levantar-se e clamou:

-Deusa, ajude-me! Preciso cuidar de meu jardim.

O anjo reapareceu portando uma coroa de flores, das mais belas, tocou a bruxa e pôs-lhe a coroa. Suas roupas remendadas tornaram-se brancas e em pura seda, seus cabelos se soltaram ainda rebeldes e sua casa transpor-se em luxo. Tendo a bruxa nos braços, o anjo a beijou, fechou-lhe os olhos e ela morreu, mas tinha semblante feliz de vida ganha.

Mas tarde o povo foi reclamar da ausência dos grãos e o anjo exuberante gritou dos jardins tendo-a nos braços:

-Eis aqui a serva bendita da Mãe! Filhos vãos da inveja e da cobiça não sabeis vós mesmos cultivar a terra?! Pois o façam, pois só os que transmitem amor, e não apenas falando-o, poderão se deliciar nos jardins da Mãe um dia, pois os que não o fazem voltarão para fazê-lo!

“O jardim em que vês é obra do amor e dedicação daquela em que vós mesmos negastes. Ela em sua miséria tornou-se a mais rica enquanto os vossos jardins morreram por falta de amor! Não esperem que outros façam por vós, nem esperem milagres sem dedicação, pois eis que são vós os condutores de tudo o que será de vós, seja nesta ou em outra história!”

E ao falar isso o anjo desapareceu em meio ao jardim junto com a velha serva. Os habitantes... Esses voltaram a cultivar suas terras, mas o jardim da bruxa que muito lhes ensinou era cultivado por todos do vilarejo em sua honra e os frutos do jardim, pobre em outrora, eram divididos entre todos, ainda sendo os melhores dos frutos. Quanto a bruxa, sem herdeiros e amigos, foi para longe, mas jamais fora esquecida.


D'Artagnan Abdias.

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